AMOR PLATÔNICO Luiz Antonio Nunes

quinta-feira, 26 de março de 2009

AMOR PLATÔNICO

Luiz Antonio Nunes

É o 3214! Pensa Jeová com si mesmo.

Jeová referia-se ao numero da composição do Metrô que acabara de estacionar na estação. Todo o dia de sua janela, Jeová, ficava de segunda a sexta-feira, pois as 07h15min da manhã era o horário da composição estacionar. Ele tinha um motivo especial. Nesta composição, no terceiro vagão, vinha sempre sua amada e desejada: Vera. Faziam dois anos que Jeová levantava-se as 06h00min Tomava banho, fazia a barba, colocava sempre a mesma camisa, a mesma gravata, sempre bem lavadas e passadas, para finalmente ver seu grande amor, Vera. Na verdade Jeová não sabia o nome de sua amada, acontece que o primeiro dia em que a viu era o começo de primavera, então daí veio a origem do nome.

À medida que a composição ia parando Jeová, ajustava a gravata, conferia se estava tudo em ordem com a camisa, o cheiro, a barba, até o olhar ele ensaiava.

Quando a composição finalmente parou. Lá estava ela, Vera.Cabelos longos e lisos que reluziam á luz do vagão, dentes mais brancos que canjica, olhos cor de mel, lábios de morango, dedos longos, pele morena dourada. Ah, como ele a ama.

A composição deixa a estação, e Jeová finalmente começa a rotina de seu dia.

O Mês era junho, o dia estava frio, era uma segunda feira, daquelas de sereno frio, e lá estava ele. Jeová esperava sua amada, mas ela não veio. No próximo quem sabe, no terceiro? No quarto? No vigésimo quinto? No septuagésimo terceiro? Nada.

Jeová precisou ser retirado da janela, eram quase 15 Horas e ele estava lá... Intrépido olhando pela janela, lagrima rolavam sua face morena, e suicidavam-se despedaçando no chão, uma lágrima presa na garganta, impedia-lhe de sequer falar, reagir, fitar os olhos dos amigos e companheiros, que tentavam ao mesmo tempo consola-lo e retira-lo daquela janela. A terça feira chegou... Demorou para passar a noite, foi uma madrugada sem fim, mas a terça chegou. Lá estava Jeová, mais cedo, mais alinhado, escovou por mais de duas vezes os dentes e se recusou a tomar um café para não suja-los, amarela-los quem sabe... Ela não veio. – Deeeeeuuuuussss? O que fiz? Onde errei? Bradava Jeová de joelhos chorando, até quando conseguiram tira-lo de lá. A quarta. A quinta. Na sexta, lá estava Jeová novamente na janela, ele havia se postado ali desde as cinco da madrugada... De repente não mais que um de repente do acaso, lá vem ele, aquele gigante metálico, que brilhava ao reflexo do sol, cuspia fumaça quando os freios eram acionados, parecia um Dragão, que engolira a princesa amada, e relutava em devolvê-la, ao coração de seu amado.

- Sai satanás! Aqui você não tem poder não. Sussurrava Jeová com um terço entrelaçado na mão direita, o suor já havia tomado conta da sua face, sua camisa estava marcada, carimbada pelo suor daquele que ansiosamente esperava sua prometida.

Lá estava ela. Semblante tristonho, lábios secos, olhar de cansaço, mas lá estava ela.

Quando a composição parou totalmente, Jeová notou que o braço de sua amada estava marcado, ferido, maculado.

- Soro! Ela tava doente, Vera estava doente, meu Deus. - O que será que ela tinha?

Falava Jeová, tão baixinho que somente ele podia escutar.

Enfim, ele passou um final de semana agradável.

Na segunda feira Jeová ficou sabendo que teria que ir até o centro de São Paulo, as 06h00min da manhã da próxima quarta-feira. Logo lhe veio à mente o fato de não poder “encontrar”, Vera. Ele pediu para que mudassem o horário, implorou, quase chorou, mas de nada adiantou, já estava marcado, e não restava outra alternativa senão obedecer e acatar. Na segunda e na terça, Jeová parecia querer explicar a Vera o porquê não poderia comparecer, e de certa forma sentia-se constrangido em faltar a um encontro com sua amada.

Quarta-Feira chegou e Jeová, que sequer havia conseguido dormir, foi ao seu compromisso, já que não podia fazer mais nada para mudar o fato.

Lá chegando, após espera de aproximadamente uma hora, Jeová, olhava as paredes em seus detalhes como se pintasse com um spray no olhar cada cantinho, cada fresta, cada detalhe.

Estava sentado numa cadeira, solitário, olhar ao léu, pensando em sua amada, imaginando-a.

- Como estará ela? – Onde estará? – Será que esta precisando de mim? Pensava ele. De repente seus olhos fitam uma miragem. - Vera! - É ela. Deus... - É Vera. Ela está ali, perto. Obrigado Senhor. Como é linda. ...Pensava ele, com os olhos brilhando e ia abrindo um sorriso à medida que se levantava da cadeira. Ela esta com os brincos de três de janeiro. O anel que usa sempre as segundas, quartas, e sextas, a blusa que estava no dia 06 de junho, não sabia que ela usava óculos... E pensando levantou-se, e num pulo quase acrobático, pôs-se a andar, depois correr, e avançava aos brados: - Vera. – Vera. –Vera. Meu amor. –Vera, sou eu. –Meu amor, sou eu, Jeová.

Neste momento, vozes estridentes, que ordenavam.

- Para. – Para, senão atiro. – Para, vagabundo. –Para. – Derruba o cara. – Vai, atira.

Mas Jeová continua a correr em direção do seu amor, sem sequer ouvir o que gritavam.

De repente, tiros, mais tiros, e mais tiros.

Um corpo ensopando de sangue um uniforme amarelo, cai como uma estatua, já sem vida bate no chão.

Homens mulheres, correm, uns em direção ao corpo e outros tantos em direção a mulher.

- Meritíssima, a senhora está bem? Pergunta ofegante o oficial. E a juíza, ainda tremula. – Sim estou. – Cada coisa que acontece neste Fórum. Arremata ela, com um suspiro de alivio ao ver aquele que a atacaria, jaz desfalecido no chão da sala de audiências.

Um agente faz um comentário.

– Esse cara era meio maluco mesmo, todos os dias ficava na janela da cela no Carandiru, esperando o metrô passar.

A juíza ainda ofegante arremata.

- Credo, vira essa boca pra lá. Eu pego metrô de segunda à sexta, no mesmo horário, preciso tomar mais cuidado - arremata a juíza.

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Texto historia e roteiro de: LUIZ ANTONIO NUNES- REGISTRADO M ®
E-mail: luizcruzilia@hotmail.com

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